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sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

ESTE LUGAR QUE JAMAIS EXISTIU

Quais palavras devo usar para dizer que falhei? Como se chamam as histórias em que o protagonista entra e sai de mãos abanando, sem amores perdidos ou paixões consumadas? Se é verdade que na poesia tudo se sente, então me fale como pensam as pedras, que da beira da estrada observam a vida passar, sem jamais voltar ou parar, porque se parar, vida deixa de ser, e aí as pedras já não enxergam mais nada. No meio do caminho tinha uma pedra. Tinha uma pedra no meio do caminho. Sou pedra, mas não estou no meio do caminho. Não sirvo para os poemas.
                Escuto gargalhadas e sinto-me feliz por elas. Boas lembranças. Mas olho para trás e percebo que não era eu que ria, quem cantava ou quem vivia. É estranho lembrar-se de algo que você não viveu; sentir coçar na pele feridas que nunca foram abertas. Aterrorizado, dou meia volta e corro em direção aos momentos felizes. Não os meus, mas os de alguém que passou por mim. Não era um sorriso; eram só dentes à mostra. Pensei que havia dançado, mas percebi que eu só não queria ficar encostado na parede. Lembro-me do calor dos abraços, mas eu nem estava lá. Nunca estive.

                — O que sou eu então? Um fantasma?
                — Não. Fantasmas sentem e falam, assustam e são assustados. Fantasmas já viveram um dia, mas você sequer abriu os olhos. Você é o vento na janela, ou a chama solitária de uma vela. Você parece se mexer, mas não mexe.
               
                Não pertenço à minha história. Fui feliz num lugar que jamais existiu. Percebo agora que sou a corrente, e não o acorrentado. Sou o pássaro devorador de deuses. Sou o que acontece entre um capítulo e outro, aquilo que ninguém escreveu e que a ninguém interessa.
                Máscara grega. Farsa. História inventada. Passado inexistente. Quarto escuro. Tela em branco. Sou a fechadura para a qual nunca fabricaram uma chave.
                Entrego esta caneta em suas mãos. Pegue-a. Não tenha medo. Escreva minha história. Dê títulos aos capítulos e numere as páginas. Coloque qualquer coisa de magia, de surreal. Crie uma cena em que a lua me ilumine, em que eu pegue na mão de alguém. Não receie em escrever tragédias ou cenas fortes, mas não se esqueça de me fazer sorrir de vez em quando. Não precisa avisar-me quando a tinta da caneta estiver acabando, apenas escreva o mais intensamente que você conseguir, até o fim. Mas comece agora! JÁ! Estou pronto para nascer.




2 comentários:

Claudio Chamun disse...

Uma vez eu ganhei um cartão com a gravura de um ônibus que tinha na identificação do destino "Lugar nenhum". De repente este ônibus viria para a tua estória - rss.

www.cchamun.blogspot.com.br
Histórias, estórias e outra polêmicas

Pedro Lourenço disse...

Provavelmente vai para este lugar onde todos se sentem insignificantes...